quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Dilma tenta reforçar discurso ambiental com fundo de compensação para índios



A presidente Dilma Rousseff estuda criar um fundo de compensação para índios que vivem em áreas próximas às hidrelétricas previstas no plano de energia do governo para 2021. Também prepara a regulamentação de um artigo da Constituição que obriga o poder público a consultar as comunidades indígenas antes de operar essas usinas.

Trata-se de uma estratégia para reforçar o discurso do governo no embate com a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, uma crítica da política de desenvolvimento do País, que segundo ela não é sustentável - Ex-petista, Marina se aliou ao projeto presidencial do governador Eduardo Campos (PSB) e poderá até disputar a sucessão do ano que vem na condição de vice do pernambucano.

As duas medidas que o governo tenta agora reativar por causa do "efeito Marina Silva" ficaram paradas por quase 11 anos de gestão do PT no Planalto. A primeira delas, o fundo, é uma antiga reivindicação dos índios. Ele seria criado com dinheiro da Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos (CFURH), paga pelas empresas que exploram as hidrelétricas. A verba equivale a 6,75% do valor total de energia mensal produzida pelas usinas. Só entre janeiro e setembro deste ano, foram repassados R$ 1,3 bilhão da seguinte forma: 45% para os municípios atingidos pelos reservatórios, 45% distribuídos aos Estados onde estão as usinas e 10% para a União.

Uma das propostas que circula no governo, elaborada pelo Instituto Acende Brasil, voltado ao setor elétrico, prevê que a União abra mão de metade do que recebe, e os Estados abram mão de 22% da sua cota. O Plano Decenal de Energia 2021 do governo federal prevê a construção de 34 hidrelétricas na Região Norte do País. Atualmente elas estão em fase inicial ou ainda só no papel. Nesse plano, para o qual valeriam as novas regras de compensação dos índios, não estão incluídas as polêmicas usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio, alvos de constantes embates entre as comunidades atingidas e o governo federal.


Consultas. A segunda medida prevista no pacote pró-indígenas de Dilma se refere ao artigo 231 da Constituição, que prevê que os potenciais energéticos oriundos de recursos hídricos só podem ser aproveitados após consulta às comunidades que vivem no local de instalação do empreendimento. Segundo integrantes do governo, essa medida já é considerada urgente no Palácio do Planalto.

Adicionalmente, o governo também vai regulamentar a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário desde 2003. Essa convenção também estabelece critérios para consulta aos índios.

Em Belo Monte, por exemplo, as comunidades atingidas dizem não ter sido consultadas. Já o governo diz que fez a consulta. Ao estabelecer um critério, a ideia é acabar com polêmicas assim. "Os povos indígenas têm suas próprias formas de debater temas sobre seu futuro, e nossa regulamentação precisa dar conta disso, quer dizer, vamos criar um mecanismo que absorva o protocolo de cada povo, de cada etnia", diz o secretario nacional de articulação social da Secretaria Geral da Presidência, Paulo Maldos.

Inação na área se repete por seguidas gestões
Não seria correto atribuir à presidente Dilma Rousseff toda a responsabilidade pelos conflitos que envolvem índios e empreendedores do setor de energia. Mas também não seria incorreto indagar por qual motivo seu governo só agora parece acordar para questões envolvendo grupos que sempre estiveram na base de apoio do PT, como índios e sem-terra.

A favor de Dilma é necessário dizer que a consulta prévia aos índios, quando suas comunidades são afetadas por projetos hidrelétricos ou de exploração de minérios, não surgiu agora. Poderia ter sido regulamentada por governos anteriores, já que está prevista na Constituição, promulgada há 25 anos. O mesmo ocorre com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que também prevê consultas às comunidades indígenas e vigora no País desde 2013.

Por questões decorrentes do jogo de forças políticas, os governos foram empurrando para o mandatário seguinte a delicada e complexa questão da regulamentação e administração dos conflitos envolvendo indígenas.

Dilma não foi diferente. Ela mostrou pouco interesse pelos índios nos dois primeiros anos de mandato. Foi só após os protestos de junho, por exemplo, que abriu a porta de seu gabinete para receber pessoalmente uma delegação indígena. Da mesma maneira, só após uma semana de protestos em Brasília, no mês passado, decidiu fazer uma declaração pública contra a PEC 215, que pode transferir do Executivo para o Legislativo a tarefa de demarcação de terras indígenas.

No seu governo a Fundação Nacional do Índio perdeu prestígio, ao mesmo tempo que enfraquecia o diálogo com as comunidades. No momento, algumas organizações indígenas se recusam a manter qualquer tipo de conversa com o governo. Não sentam à mesa nem para tratar da regulamentação de leis que está sendo anunciada.
Fonte: O Estado de São Paulo

Nenhum comentário:

Postar um comentário