À
Presidenta
Dilma Rousseff
Desde a
morte de Oziel Terena, assassinado por forças policiais durante o cumprimento
de uma reintegração de posse na terra indígena Buriti em maio deste ano, uma
série de acontecimentos tem colocado em risco a segurança e a vida das
comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul. Em sua guerra particular contra os
povos indígenas, fazendeiros tem se manifestado de forma cada vez mais
agressiva no discurso e na ação contra estes povos.
Estimulado
por declarações violentas e preconceituosas de fazendeiros e seus
representantes no Mato Grosso do Sul, o conflito chega a um estado de recrudescimento
que exige de nós, organizações indígenas e indigenistas, vir a público mais uma
vez denunciar a situação urgente e gravíssima dos povos originários do estado,
e exigir uma intervenção federal imediata no Mato Grosso do Sul, de modo a
evitar mais uma tragédia anunciada no Brasil.
Em Campo
Grande, durante a invasão da sede da Fundação Nacional do Índio por 150
produtores rurais, no dia 19 de novembro, uma fazendeira gritou, dirigindo-se a
indígenas que estavam no local: "o dia 30 está chegando (...), e rogo
uma praga a vocês: morram. Morram todos!". Foi aplaudida pelos
manifestantes.
Dia 30 de
novembro foi o prazo final estabelecido pelos produtores rurais do Mato Grosso
do Sul para que o governo solucione os conflitos fundiários no estado. No
entanto, prevendo que o Estado não consiga apresentar uma proposta que
efetivamente dê cabo do problema - e que favoreça o segmento do agronegócio os
fazendeiros, através de suas associações, tem pública e repetidamente dado
declarações como esta.
"O
prazo para uma solução final é 30 de novembro. Depois disso, como já é tragédia
anunciada, os fazendeiros irão partir para o confronto legítimo para defender
seu direito de propriedade. E vai haver derramamento de sangue, infelizmente",
declarou o vice-presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul
(Acrissul), Jonatan Pereira Barbosa, na tribuna da Comissão de Reforma Agrária
do Senado Federal, no dia primeiro de novembro, conforme publicado no sítio
eletrônico da entidade.
O
presidente da Acrissul, Francisco Maia, no último dia 8, em reunião com 50
produtores rurais do estado, disse: “A Constituição garante que é direito do
cidadão defender seu patrimônio, sua vida. Guarda, segurança, custa dinheiro.
Para entrarmos numa batalha precisamos de recurso. Imagine se precisamos da
força de 300 homens, precisamos de recurso para mobilização”.
Em nova
reunião, no dia 12 de novembro, o vice-presidente da Federação da Agricultura e
Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Nilton Pickler, também veio à público
corroborar a posição da Acrissul: “Estamos em uma terra sem lei, onde
invadir propriedade não é mais crime, alguma reação precisa ser feita”,
afirmou.
As
entidades representativas dos produtores rurais do estado estão organizando,
para o dia 7 de dezembro, em Campo Grande, um leilão de animais, commodities,
máquinas e produtos doados pelos próprios pecuaristas do estado, para arrecadar
recursos para ações contra os indígenas. Deram ao evento o nome de "Leilão
da Resistência". Declararam, no último dia 19, que já receberam 500
cabeças de gado como doação, equivalentes a, no mínimo, 500 mil reais.
O documento
final da Quarta Assembleia do Povo Terena, que contou com a participação de
mais de 300 lideranças Indígenas de todo o estado, representando os mais de 70
mil indígenas que lá vivem, declarava: "a tragédia está anunciada em
Mato Grosso do Sul (...). É pública e notória a ameaça concreta intentada
contra os povos indígenas pelos ruralistas deste estado". Para os
indígenas, está claro: os “leilões da resistência" anunciados pelos
produtores rurais "tem por objetivo financiar milícias armadas".
Em carta,
os indígenas criticaram o Estado pelo abandono das negociações, no sentido de
encontrar saídas para a questão indígena. "O governo federal instalou
(...) uma mesa de diálogo na tentativa de resolver a demarcação de nossos
territórios. No entanto, após vários prazos estipulados pelo próprio ministro
[da Justiça], não há nada de concreto a ser apresentado aos povos indígenas".
As
comunidades Terena, Guarani-Kaiowá, Guarani Ñandeva, Kinikinau e Kadiwéu em
luta pela garantia de seus territórios tradicionais, tem relatado e denunciado
à Polícia Federal, à Funai e ao MPF um sem número de casos de ataques a tiros,
invasões, intimidações e ameaças de morte que os indígenas vem sofrendo no
último período. Apesar disso, até o momento, nenhuma segurança permanente está
sendo oferecida a estes povos.
Os
indígenas conhecem bem o trabalho da segurança privada que os fazendeiros
pretendem ampliar na região. Em contexto do conflito envolvendo indígenas e
fazendeiros, em novembro de 2011, a empresa de segurança privada Gaspem, que
prestava e ainda presta - serviços a proprietários de terras que incidem sobre
território tradicional indígena, foi acusada de envolvimento na morte do
rezador Guarani-Kaiowá Nízio Gomes, no tekoha Guaiviry, em Aral Moreira. Na
denúncia, o Ministério Público Federal do Mato Grosso do Sul (MPF-MS)
classificou as atividades da empresa como de uma “milícia privada”, exigindo a
suspensão das atividades da companhia. Em função do caso, sete pessoas estão
presas, conforme relatou o MPF.
Jornais e
televisões locais também tem associado o termo "milícias armadas" ao
discurso dos ruralistas sobre o leilão e sobre as ameaças do dia 30 de
novembro. Agências de notícias internacionais categorizaram o caso como
"conflito sangrento (...) com características de guerra territorial".
É público e notória
que, no Mato Grosso do Sul, os fazendeiros estão organizando força paramilitar
para atentar contra a vida de coletividades e contra o Estado de direito no
Brasil.
A
"resistência" dos latifundiários é contra a demarcação das terras
indígenas. É contra a realização de laudos e perícias pela Funai. É contra a
organização política dos indígenas, que avançam na retomada de seus territórios
tradicionais, frente à morosidade do Estado e da Justiça, de toda a violência
que vem sofrendo, das mãos das forças policiais estaduais e federais, e das
seguranças privadas “legais” ou ilegais que atuam na região. A dita
"resistência" é, a rigor, contra a vida destas pessoas.
Em função
desta conjuntura, extensão de um violento processo histórico de espoliação,
confinamento e extermínio dos povos indígenas desta região, as organizações
signatárias vem a público exigir da presidente Dilma uma intervenção federal
imediata no Estado do Mato Grosso do Sul. O poder público pode e deve evitar
esta “tragédia anunciada”, repetição sistemática do genocídio contra os povos
indígenas. E isto precisa ser feito agora. O reconhecimento e a demarcação das
terras indígenas é a verdadeira solução para a situação que está posta no Mato
Grosso do Sul.
Brasília,
21 de novembro de 2013
Conselho Indigenista
Missionário - Cimi
Articulação dos Povos
Indígenas do Brasil - APIB
Articulação dos Povos
Indígenas da Região Sul - ArpinSul
Articulação dos Povos e
Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo - Apoinme
Aty - Guassu Guarani
Kaiowá
Conselho de Caciques
Terena
Conselho Indígena de
Roraima - CIR
Instituto Kabu -
Nejamrô Kayapó
Associação dos Índios
Tupinambá da Serra do Padeiro - AITSP
CCPIO AP. Galibi
Marworno - Paulo R. Silva
Vídeo nas Aldeias -
Vicent Carelli
Operação Amazônia
Nativa - Opan
Instituto de Pesquisas
e Formação Indígena - Iepé
Instituto Sócio
Ambiental - ISA
Associação Terra
Indígena Xingu - ATIX
Instituto Indígena para
Propriedade Intelectual - Inbrapi
HAY - Dário Vitória
Kopenawa Yanomami
HAY - Davi Kopenawa
Yanomami
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