terça-feira, 2 de julho de 2013

SOCIEDADES INDÍGENAS E A AÇÃO DO GOVERNO



O tratamento da questão indígena é um dos assuntos prioritários na agenda social de qualquer Governo. O índio brasileiro é um cidadão que tem anseios, carências e necessidades específicas, que precisam ser atendidas pelo Estado.
Com a moderna antropologia, aprendemos que a cultura indígena não é, como muitos supõem, uma etapa primitiva da escala civilizatória, mas sim uma realidade cultural diferenciada, capaz de reproduzir estilos próprios de organização e desenvolvimento.

A realidade indígena brasileira ainda é pouco conhecida. A taxa de natalidade dos indígenas é superior à média nacional. Em muitos aspectos, o Brasil contemporâneo é mais indígena do que normalmente se supõe. Ainda que culturalmente transformada pela interação secular com os processos civilizatórios, a presença indígena é fortemente percebida no tipo físico e nos costumes de amplos segmentos da população, sobretudo entre os brasileiros do Nordeste, da Amazônia e do Centro-Oeste. É verdade que os grupos indígenas brasileiros estão reduzidos a uma pequena fração do que foram no passado, também é verdade que este segmento da população encontra-se hoje em plena recuperação demográfica.

Estima-se que a população indígena do Brasil abranja, atualmente, cerca de 326 mil pessoas, distribuídas em 215 diferentes etnias que falam cerca de 170 línguas distintas. Embora concentrada em grande parte na Amazônia, a população indígena brasileira está dispersa em quase todo o território nacional. Alguns grupos ainda vivem em relativo ou completo isolamento, outros estão integrados à economia regional, mas se consideram e são reconhecidos como membros de uma comunidade culturalmente diferenciada.

Para esses grupos, a afirmação do direito ao etno-desenvolvimento e a preservação de sua identidade cultural passam pela garantia de seus direitos constitucionais, pela posse da terra, pela defesa de condições dignas de vida, e pela conquista de seu espaço político no seio do Estado e da nacionalidade. E são exatamente essas as metas da política indigenista do governo.

A questão da terra é central. As terras indígenas no Brasil cobrem, no total, 947.011 quilômetros quadrados, correspondendo a cerca de 11,13% do território nacional, ou seja, o equivalente à França e Inglaterra juntas. Só o território Yanomami, já inteiramente demarcado, é igual ao de Portugal. 

Dentre as 554 áreas indígenas reconhecidas pela FUNAI, 223 já se encontram demarcadas, homologadas e registradas, cobrindo uma extensão de 456.864 quilômetros quadrados. Outras 52 áreas estão demarcadas. Das 279 áreas indígenas por demarcar, 136 já estão identificadas ou em processo de identificação.

Em 1995 e começo de 1996, a demarcação avançou. Com a promulgação do decreto nº 1775/96, procurou-se assegurar maior transparência e segurança jurídica ao procedimento demarcatório. A preocupação do Governo é garantir os direitos dos indígenas e aperfeiçoar os dispositivos legais relativos a esses direitos.

Mas não basta demarcar. é preciso dar segurança às populações indígenas. As terras indígenas, em sua grande maioria, localizam-se em áreas de difícil acesso, próximas a áreas de fronteira e muitas são cobiçadas por fazendeiros, garimpeiros e também por aventureiros. A FUNAI gasta hoje cerca de 30% do seu orçamento para operações de retirada de intrusos das áreas indígenas. A FUNAI estará retomando brevemente a operação Yanomani em Roraima, que vai retirar em torno de 1500 garimpeiros das terras dos índios Yanomani e Macuxi. Outras operações serão feitas na área do Rio Xingu e na região do alto Rio Guamá, no Pará, onde vivem perto de 30.000 pessoas não índias em terra dos índios Tembé.

Além disso, o Governo desenvolverá atividades de saúde e educação específicas para as populações indígenas. Recentemente, a Radiobrás criou um programa de rádio especial para os indígenas. O Ministério da Agricultura e a FUNAI estão desenvolvendo um projeto inovador de apoio às atividades produtivas e agropecuárias realizadas por indígenas. Outra preocupação é com a proteção do meio ambiente. O Governo intensificará as medidas de interdição da exploração predatória e ilegal de recursos naturais, de remoção de invasores, especialmente garimpeiros em terras indígenas e promoverá a auto-sustentação e o desenvolvimento comunitário dos grupos indígenas.

Não obstante os avanços já realizados, persistem alguns problemas. A região Amazônica, onde está a maioria das comunidades indígenas, abriga 17 milhões de brasileiros. É preciso identificar e realizar projetos de desenvolvimento econômico para esta região, que sejam compatíveis tanto com a preservação do meio ambiente quanto com a proteção dos territórios indígenas.

Na Amazônia, vivem ainda cerca de 300 mil garimpeiros, que têm sido os principais responsáveis pela invasão de terras indígenas. Por isto, além da demarcação dos territórios e do policiamento de suas fronteiras é necessário buscar alternativas econômicas ao garimpo de modo a remover uma das principais ameaças às comunidades indígenas.

O suicídio dos índios Guarani-Kaiowá constitui também uma fonte de preocupação que requer uma compreensão mais ampla. É por isso que o Governo deseja promover a discussão com a sociedade civil a respeito das ações de apoio e valorização das populações indígenas. A participação de organizações não-governamentais é fundamental nessa questão. O Governo tem trabalhado com essas entidades, com resultados muito positivos.

No plano externo, o Brasil desenvolve ampla cooperação sobre as questões indígenas. O recente acordo firmado com a Alemanha, no âmbito do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil deu novo impulso a esse intercâmbio, particularmente no que se refere a demarcação de terras indígenas.

Esses são alguns elementos da política indigenista deste Governo. Eles refletem uma disposição sincera e a determinação de agir em defesa da sobrevivência e dos valores culturais dos nossos índios.

Fernando Henrique Cardoso

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